“Penso que, de certa forma, o país ainda não dispõe de cultura suficiente para perceber que a Geografia é mais importante do que aparenta!”

Terminou a licenciatura em Geografia e Planeamento Regional, na NOVA FCSH, em 2013, e prosseguiu estudos no Mestrado de Gestão do Território – Planeamento e Ordenamento do Território. Bruno Alves, tem 29 anos e nunca teve uma experiência duradoura e estável na área da Geografia. Um testemunho que mostra que o mercado de trabalho pode não ser fácil, mas que o importante é não desistir! 

(GeoLearning) Terminaste a licenciatura há relativamente pouco tempo. Estamos em 2020 e todos nós, futuros geógrafos, estamos ansiosos pela entrada no mercado de trabalho, mas ao mesmo tempo, receosos das condições que vamos encontrar, especialmente no que concerne às oportunidades de emprego. Como é que viveste esta dualidade de emoções na tua altura? Este sentimento de receio já era comum ou pensas ser algo que se tem vindo a acentuar especialmente com o tempo?

(Bruno Alves) Entrei na faculdade já a saber perfeitamente das dificuldades que iria encontrar nesse campo. Estávamos ainda em plena crise económica, só escolhia a Geografia quem fosse corajoso. Na altura, pensei que, se era para continuar os estudos, teria de ser naquilo que mais ambicionava. Em relação ao pessoal mais velho, quando entrei fiquei com a sensação que era mais ou menos a mesma coisa, as perspetivas de emprego não eram as melhores, apesar das estatísticas do nosso curso dizerem o contrário.

Assim que terminaste a licenciatura, começaste logo a procurar emprego na área? De que forma é que iniciaste essa procura e que frutos é que ela deu?

O meu grande medo sempre foi ficar em casa sem fazer nada. Antes de terminar o curso informei-me, fiz bastantes pesquisas e, na altura, pensei que o que faria mais sentido seria prosseguir para Mestrado – as oportunidades supostamente seriam maiores e podia ainda especializar-me no que realmente eu gostava, o Planeamento e Ordenamento do Território. Entretanto, a meio do percurso de Mestrado, comecei à procura de emprego. O meu objetivo “ideal” era ter alguma coisa para fazer assim que terminasse os estudos. Claro que as coisas não funcionam assim e arranjei antes de terminar. De facto, consegui alguns trabalhos na área, mas eram precários e não me davam estabilidade. Acabei por conseguir emprego no Aeroporto de Lisboa, em part-time, e assim conseguia conciliar com a precariedade que a Geografia me oferecia na altura. Não era o que tinha sonhado, mas foi ótimo para a carteira e até mesmo para o meu crescimento pessoal e profissional.

Nunca tiveste uma experiência duradoura e “segura” na área da Geografia. Quais os principais motivos para que tal tenha acontecido? Nunca surgiu a oportunidade? Foste perdendo o interesse e a motivação ao longo do tempo? 

Penso que, de certa forma, o país ainda não dispõe de cultura suficiente para perceber que a Geografia é mais importante do que aparenta. As oportunidades existem, não existem é de forma “normal”. Por um lado, temos o Estado que nem sempre tem vagas (e quando as tem é de um escrutínio tal que é bastante difícil entrar); por outro, temos algumas empresas que, na grande maioria, optam por contratações pontuais e a recibos verdes.

No meu caso, não foi falta de interesse. Como já referi, fiz alguns trabalhos na área, mas a recibos verdes e não me deixavam seguro. Entretanto, quando consegui o  emprego no Aeroporto de Lisboa continuava a conciliar as duas coisas, sem problema, e admito ter sido verdadeiramente feliz com as duas realidades. Mas houve uma altura em que tive de escolher: ou entrava a full time no aeroporto, ou continuava na mesma. Sem trabalho seguro na área da Geografia, o dinheiro e a estabilidade financeira acabaram por falar mais alto. 

Fiquei no Aeroporto de Lisboa até ao início deste ano. Com a questão da pandemia do Coronavírus, o meu contrato de trabalho não foi renovado, mas consegui, pouco depois, arranjar trabalho num supermercado. Entretanto, candidatei-me a um estágio PEPAL num município e, felizmente, consegui o lugar. 

Se surgisse uma oportunidade de emprego na área, um emprego “de sonho”, aceitarias de imediato ou pensarias duas vezes? Qual seria este “desafio ideal”? Sentir-te-ias preparado?

Tendo em conta o meu percurso, cada vez mais me apercebo que não somos talhados apenas para uma coisa. Gosto muito de Geografia sim, mas descobri que também gosto muito de aviões ou até de crianças. Tentam formatar-nos para fazer apenas uma coisa e a realidade é que isso não funciona assim. Isto para dizer que pensaria duas vezes, depende do que me era oferecido, mas pensaria sempre. Tudo o que nos faça crescer é sempre bem vindo.

“Pergunta da praxe”: o que dirias a um finalista de Geografia e Planeamento Regional? Qual o teu conselho mais sincero?

Estuda, luta por aquilo que gostas e não te preocupes com o que os outros pensam. A vida é tua e o caminho a seguir é o que tu achas que deves seguir. Seja o caminho certo ou errado a escolha tem de ser tua. Se foi o certo, ótimo; se foi o errado, ainda melhor; são esses que te fazem crescer e ser um melhor adulto. 

Entrevista: Ana Mendes

Entrevistado: Bruno Alves