Situado em plena cordilheira dos Himalaias, o Butão é um pequeno país, – entrincheirado entre os gigantes Índia e China, cujo modo de vida sempre se encontrou muito relacionado a conservação da natureza e dos seus recursos. O país da “Terra do Dragão”, como vulgarmente é apelidado, é conhecido mundo fora pela tradição monástica (ligada ao culto do budismo) e pelo pioneirismo na criação do Índice da Felicidade. Foi na década de setenta do século passado que, o então monarca butanês introduziu o conceito, criando um um indicador com uma abordagem holística (alternativo ao PIB), que conjuga o crescimento económico, com o desenvolvimento social e a sustentabilidade ambiental – conceito que tem comandado as decisões políticas do Butão. Mas mais do que um aparente conjunto de “monges felizes” (como é, muitas vezes, conhecido) perdidos no meio dos Himalaias, o Butão detém um outro título que o distingue do resto do mundo: é o único país negativo em carbono! Sim, isso mesmo, negativo!
Em 2009, durante a realização da COP 15, o país prometeu “manter-se neutro em carbono, para sempre”; promessa reiterada no encontro do Acordo de Paris e na COP 21 (2015), (Yangka, et al, 2018) e que tem sido cumprida pelo pequeno país. Segundo dados da World Bank, em 2017, o Butão emitiu para a atmosfera cerca 2.2 milhões de toneladas de CO2, tendo, no entanto, conseguido absorver cerca de 6.3 milhões de toneladas (superávit de 4 milhões de toneladas) (World Bank, 2018). É por isso que, mais do que neutro, o país é negativo em carbono. Mas como é que isto possível? Este superávit é justificado – para além da consciência intrínseca da população – pela vasta gama de leis e iniciativas, que se enquadram nesta lógica de proteção e conservação da natureza. Em 1974, foi promulgada a “Política Florestal” (revogada em 1995), que impõe a “manutenção de pelo menos 60% da área do país sob cobertura florestal”. Este é um dos documentos legislativos mais importantes do país e que foi, inclusive, posteriormente, incluído na Constituição. (FAO, 2008). Em 2018, as áreas florestais ocupavam 71% da área total do país (Statistical Yearbook of Bhutan, 2019) e todas elas se encontravam sob o estatuto de “Reserva Florestal do Estado” – denominação que reconhece que o governo butanês tem plenos poderes e direitos para aplicar medidas e ações de conservação e proteção sobre todas as florestas do país, incluindo áreas de privado, garantindo, ao mesmo tempo, o “direito de acesso aos recursos pelas comunidades locais”. (Ministry of Agriculture and Forests of Bhutan, 2009).
Por outro lado, a neutralidade carbónica do Butão é também justificada pela produção e utilização de energias renováveis, nomeadamente de energia hidroelétrica. Em 2018, o país produziu aproximadamente 7 mil MW de eletricidade, dos quais mais de 4,5 mil MW foram exportados (Statistical Yearbook of Bhutan, 2019), sendo expectável que “consiga obter 50% da sua capacidade hidroelétrica, até 2030”. (World Bank, 2018)
Apesar de tudo, este pequeno país asiático está, também, a sofrer as duras consequências das alterações climáticas. Dezenas de glaciares estão a derreter e a causar deslizamentos de terra, causando perdas materiais e humanas – situações que se tornarão, infelizmente, mais recorrentes. Um povo que nada contribui para a degradação das condições ambientais, está, tal como todos os outros, à mercê da mudança. Mas nem por isso altera o seu comportamento e atitude. Embora continue a crescer economicamente, tem conseguido balancear os domínios económicos, sociais e ambientais, continuando a lançar iniciativas “verdes” como o “Clean Bhutan”, o “Green Bhutan”, ou o “Bhutan for Life” . E claro, acima de tudo, continua a manter uma consciência individual e coletiva de que a sua sobrevivência, depende somente da sobrevivência do planeta!
Autor: Ana Mendes
Referências Bibliográficas:
FAO – Bhutan. Information as of 2004. 2008. Disponível online em: http://www.fao.org/forestry/14918-07c6dbfadaf130d43e907a5497545a570.pdf. Consultado a 25 de fevereiro 2020;
MINISTRY OF AGRICULTURE AND FORESTS – National Forest Policy of Bhutan. 2009. Disponível online em: https://www.gnhc.gov.bt/en/wp-content/uploads/2017/05/National_Forest_Policy-1.pdf Consultado a 29 fevereiro 2020
NATIONAL STATISTICS BUREAU – Statistical Yearbook of Bhutan 2019. 2019. Disponível online em: http://www.nsb.gov.bt/publication/files/SYB_2019.pdf. Consultado a 25 fevereiro 2020;
WORLD BANK – Concept Note: Bhutan Climate Fund. 2019. Disponível online em: http://documents.worldbank.org/curated/en/971531538568130794/pdf/Bhutan-Climate-Fund-Concept-Note.pdf. Consultado a 25 fevereiro 2020;
YANGKA, D, RAULAND, V, NEWMAN, P – Carbon Neutral Policy in Action: the case of Bhutan. 2018. Disponível online em: https://www.researchgate.net/publication/329261835_Carbon_neutral_policy_in_action_the_case_of_Bhutan. Consultado a 25 fevereiro 2020.